Alzheimer de Abraços

Um dos Exercícios de um Workshop de escrita que fiz com a maravilhosa Mónica Menezes .

Mais alguém por aí com medo de esquecer os abraços?




                                                                                             Foto

"Papá!

Achas que há Alzheimer de crianças?

Como assim Alzheimer de crianças, Pedro?

Eu acho que tenho Alzheimer dos abraços do avô.

Pedro, isso não existe.

Estou a esquecer os abraços do avô. Não é todo o dia, às vezes, lembro-me melhor à noite com a esperança de que de manhã as saudades me transportem até ao avô.

Pedro, o Alzheimer não funciona assim.

Mas não é esquecer, Papá? Das palavras, dos barulhos?

Eu penso que se o avô sentir demasiado silêncio, pode sentir-se abandonado, mas não acho que o amor quando é imenso, se esqueça.

Mas tenho medo que o avô tenha um desgosto e, se as pessoas me deixassem vê-lo, poderiam perceber que eu estou a ficar com Alzheimer de abraços e depois de eu explicar deixavam-me ficar com ele, porque tenho a mesma coisa.

Pedro, não é por isso que não podemos estar com o avô, é por causa da pandemia e nem tu, e nem o avô, graças a Deus, estão infectados.

E achas Papá, que  me deixam entrar se eu disser, que há abraços em perigo de esquecimento e amor a transbordar?

Pedro, os dias vão ficar mais coloridos, com muitos mais abraços.

Só temos de ter paciência e esperar."




Da minha janela

Da minha janela, vejo uma praceta e a ponte por detrás dos prédios que, ao  mudar as suas cores com a  luz do dia em contornos de cinzas e rosa me  indica aonde vamos no dia, aonde vamos no ano e aonde vamos na vida.
Na praceta, apesar da pandemia, ainda vejo os do costume passar, vejo janelas pintadas à noite pela vida de cada um.
Vejo uma senhora que procura a morte há muitos anos, pode fugir da pandemia mas põe-se à janela a fumar, todos os dias, com toda a sua obesidade mórbida, janela essa,  que quase nem dá para encaixar toda a sua estrutura. Sorri sempre ficando com os olhos e rugas rasgados  fazendo o seu semblante parecer uma caricatura. Acredito piamente que esta é a personagem que ainda não encontrou a sua crónica ou ficção.
À meia noite, quando passeio a minha cadela, vejo sempre os que, penso, são símbolo da solidão e velhice e antecipo o meu futuro.
Aqui na nossa zona, não somos nem ricos, nem pobres, roçamos ombros com os dois extremos.
Basta descer a rua e encontramos alguns dos prédios dos mais abastados de Lisboa à beira rio.
O barulho dos camiões do lixo às duas da manhã só oiço como aviso de que já deveria estar a dormir e deixar a cabeça descansar.
Agora que é Primavera vemos andorinhas, melros pretos e às vezes borboletas e abelhas visitam a minha corda da roupa, gosto tanto de os ver.
Da minha janela vejo tudo, vejo tudo parar e vejo também tudo avançar com uma velocidade sem piedade.
E tu, que vês da tua?




How to keep your life together

...you don't...

      Satisfaction 

                  Is moving in the direction of who you really are 


Life Goals